Se todo mundo é VIP, ninguém é

Valorize clientes leais, eles estão na carteira, mas podem sumir

Outro dia, ouvi o seguinte relato do ex-aluno Luís Henrique de Mendonça Paulo: ‘Entrei pela primeira vez numa loja de roupas no shopping e fiz a compra. No final, recebi um cartão de Cliente VIP (Very Important Person, ou, Pessoa Muito Importante, em português). Estranhei pois era a primeira vez que entrava lá, mas ser VIP é bom

e dá aquela sensação de que você será tratado de maneira diferenciada. Então resolvi curtir a sensação. Era um belo cartão dourado metálico, imitando cartões de crédito, bem layoutado. Mas logo a moça do caixa começou a desfazer aquele momento mágico. Pediu que eu olhasse o verso do cartão e lá estavam espaços para preencher com ‘selinhos’, que eu ganharia a cada nova compra. Ao juntar cinco selinhos no cartão, eu teria direito a um bônus em mercadorias. Ao prestar mais atenção, percebi que em letras miúdas estava escrito que a ‘promoção’ era válida por um ano. Tudo piorou quando vi um número de controle no cartão: 77.854!!! Ora, ser VIP é ser exclusivo! Mas, nesse caso, ser VIP era ter de gastar mais num curto período de tempo.’

Essa história, infelizmente freqüente, ilustra a confusão de conceitos entre mecânicas promocionais e ações de marketing de relacionamento. Na verdade, o mecanismo relatado é uma operação promocional com benefício não imediato – exige repetição de compra num prazo determinado para após esta ‘fidelidade’ garantir um bônus, um prêmio para valorizar o cliente que se demonstrar constante dentro das regras da promoção.

Mecânicas assim são comuns (em pizzarias, por exemplo) e o que causou sensação de desconforto foi chamá-la pretensiosamente de ‘Cartão Cliente VIP’. Claro, essa operação não tem nada de VIP. Primeiro, porque se todo cliente for VIP não há diferenciação que valorize os realmente importantes – aqueles que escolheram comprar, pois foram atraídos e convencidos por toda abordagem de marketing da empresa, não só pelo preço e promoções; e, segundo, porque não se busca com os VIP’s só oferecer descontos, o objetivo é fornecer vantagens alinhadas aos mesmos motivos que os tornaram leais.

O ponto é que toda empresa tem clientes que a escolhem em função de motivos somente comerciais: esses são geradores de volume, apesar de fornecerem baixas margens. É comum empresários darem atenção exacerbada a eles. Esse é o erro: dar atenção ao grupo de clientes de demanda maior e esquecer do grupo que oferece maior rentabilidade. Toda carteira tem clientes que optam comprar por outros motivos além de preço, como serviços, atendimento, conveniência e localização. Esses podem não oferecer os maiores volumes de faturamento, mas formam os mais lucrativos. E leais, pois escolheram comprar pelo que a empresa é e fornece – e não só pelo seu preço.

É preciso dar mais atenção aos que preferiram dar mais atenção ao negócio – os VIP’s da carteira. Que, é bom salientar, não se qualificam em função de uma compra. Para determiná-los é necessário estudar o histórico de relacionamento deles com a empresa – só o tempo demonstra quem é realmente valioso. Por experiência, no geral, uma companhia tem de 5% a 30% desses clientes. Mas nem sempre as empresas desenvolvem estratégias para eles. Infelizmente trabalha-se muito com o restante que oferecem baixas margens e são motivados pela negociação.

Essa é a incoerência nas estratégias junto aos clientes. Quem mais merece, porque escolheu pelo que a empresa é, e fornece melhores rentabilidades, acaba tendo menos atenção e cuidados. Com isso, a organização corre o risco de alimentar somente clientes negociantes até que esses cheguem a 100% da carteira. O que é preocupante, pois há o iminente fato de sempre aparecer concorrentes com preços melhores.

Por essas razões é necessário dar mais atenção aos verdadeiramente VIP’s. São eles que ajudam a equilibrar a rentabilidade de toda operação.

Escrito por : Marcelo Miyashita

Apaixonado por praticar, aprender e ensinar marketing desde 1995.