Muito cuidado ao aplicar as técnicas de networking. Mais importante que uma rede de contatos é uma rede de pessoas movida à base de empatia, reconhecimento e reputação. E não a base de interesses
Networking é mais um neologismo do universo empresarial que vem se transformando em palavra comum no vocabulário de qualquer empresário. Mais do que isso, para alguns, é mais que uma palavra, é uma competência. Seguindo o raciocínio, trata-se de algo necessário para estabelecer boas relações de negócios e trabalho.
Mas a questão é que o networking não pode ser visto apenas como ferramenta de negócio. Infelizmente, há muita gente praticando rede de contatos, seguindo a risca a cartilha do networking e todas as suas recomendações. Tudo muito planejado. Um excesso. Recentemente, estive num evento como convidado. Cheguei sem ser apresentado, sentei-me ao fundo e, após algum tempo, fomos para o coffe-break. Ou melhor, a hora do “networking”. Neste momento, aconteceu uma situação interessante: algumas pessoas não olhavam para as pessoas. Olhavam para os seus crachás! Até quando se apresentavam, até no aperto de mão.
Na hora pensei, o que é isso? Tudo bem, é importante termos bons contatos, sermos conhecidos, nos apresentarmos, mas daí colocar o relacionamento como causa é desespero. Ou falta de bom senso, ou excesso de valorização da ‘competência’ de estabelecer e manter contatos.
Relacionamento é conseqüência. É resultado de empatia e reconhecimento, não apenas profissional, mas pessoal. Relacionamento ‘de verdade’ existe entre pessoas de verdade e não entre crachás e interesses comerciais. Por isso mesmo, um contato não é um relacionamento. É simplesmente isso, um contato sem reconhecimento. Ou seja, quase nada.
E é esse “quase nada” que, infelizmente, muita gente se preocupa em conseguir. Nada contra o ato, desde que não pensem que estão estabelecendo relacionamentos, que é outra história. Relacionamentos são resultados, envolvem emoção, proximidade e tamanha profundidade que conseguem gerar até novos contatos. Quem gosta e admira alguém, fala bem, dá o seu aval, e até recomenda. Isso é relacionamento, que, pode sim, começar com um contato comercial. Mas é muito difícil surgir empatia e proximidade quando duas pessoas são levadas a se conhecerem apenas, e somente, por interesses comerciais.
Talvez por esta razão, nossos melhores contatos surgem quando não estamos tão “interesseiros”, quando deixamos a casualidade cumprir o seu papel, a simpatia encontrar o seu espaço e os olhos olharem nos olhos.
Martin Buber, filósofo judeu que escreveu o clássico Eu e Tu na primeira parte do século passado, pregava que a excessiva vontade de extrair troca em todos os contatos criava uma relação baseada em “eu e isso”, em outras palavras, uma relação onde o outro é visto como coisa e não pessoa.
Isso me faz lembrar Robin Williams no filme O Homem Bicentenário, baseado num conto de Isaac Asimov, onde interpretava Andrew – um robô-mordomo que se auto-intitulava “Isso”, pois tinha consciência que não era pessoa, era uma coisa. Buber defendia que nós precisamos nos relacionar não esperando algo em troca, mas por simples respeito, amor, amizade e consideração pela pessoa. Este relacionamento Buber denominou de “eu e tu”.
Portanto, muito cuidado com o exagero do networking. Estabelecer contato é importante, mas olhar nos olhos é fundamental. Tratar pessoas como pessoas, independentemente das letras pequenas do crachá ou do cartão de visita. Isso sim é o início de um bom contato, com a empatia, que ao longo do tempo pode criar laços de relacionamento, com espaço para o surgimento do reconhecimento e, logo depois, a reputação.
Assim podemos agir nos coffee-breaks, sem a ambição da recompensa e com o gosto de uma nova amizade.
Apaixonado por praticar, aprender e ensinar marketing desde 1995.